A cozinha como espaço do sagrado no culto de Òrìṣá: notas introdutórias

Autores

  • Márcia Maria de Medeiros Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, MS, Brasil https://orcid.org/0000-0002-1116-986X
  • João Paulo Ifájómílójú Deluque Rufatto Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, MS, Brasil

DOI:

https://doi.org/10.55892/jrg.v8i19.2358

Palavras-chave:

Culto de Òrìṣá, Oferenda Alimentar, Ancestralidade, Cosmovisão Iorubá

Resumo

Este artigo propõe uma reflexão sobre o papel da cozinha no culto de Òrìṣá como território do sagrado, no qual os alimentos não apenas nutrem o corpo, mas também servem como veículos de comunicação entre o mundo material (ayé) e o espiritual (òrùn). A partir de uma abordagem qualitativa, de natureza exploratória e com base no método da observação participante (Mónico et al., 2018), o estudo incorpora uma perspectiva autoetnográfica (Balbina e Medeiros, 2021), na medida em que os autores são praticantes iniciados no culto tradicional e registram os saberes a partir da vivência e da escuta ritual. O referencial teórico mobiliza autores como Juana Elbein dos Santos (2012), Pierre Verger (2023), Jacob Olupona (2011), Roger Bastide (1961) e Claude Lévi-Strauss (1976), que sustentam a compreensão da alimentação como prática litúrgica, simbólica e comunitária. Destacam-se no texto elementos como a importância do cargo de Ìyábase nas casas de culto, a comensalidade sagrada, os interditos alimentares (Èèwọ̀), os itan e versos dos odù Ifá que vinculam os alimentos às histórias míticas e às escolhas votivas dos Òrìṣà. Demonstra-se como o preparo, a consagração e a partilha de alimentos atualizam pactos ancestrais em uma lógica de tempo circular, fortalecendo vínculos entre indivíduo, comunidade e divindades. A pesquisa também discute o gesto alimentar como ato de hospitalidade radical, que acolhe o sagrado no cotidiano. Ao final, conclui-se que a cozinha tradicional é um lócus de saber ancestral que opera tanto na dimensão espiritual quanto na organização ética e social da vida.

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Biografia do Autor

Márcia Maria de Medeiros, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, MS, Brasil

Graduada em História pela Universidade de Passo Fundo (UPF); Mestra em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS); Doutora em Letras pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Professora Associada da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) para os cursos de Turismo e Enfermagem.

João Paulo Ifájómílójú Deluque Rufatto, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, MS, Brasil

Bàbá kekere (pai pequeno) da casa de culto tradicional Egbe Oduladun Ilè Asé Sangó de Curitiba. Consultor especializado da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), para o projeto Epistemologias Africanas e Cosmogonia: Arquétipos de Aeon Orisá e Cosmovisão Ancestral -  Èṣù, Ògún, Ọ̀ṣọ́ọ̀sì, coordenado pela Professora Doutora Márcia Maria de Medeiros.

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Publicado

2025-08-08

Como Citar

MEDEIROS, M. M. de; RUFATTO, J. P. I. D. A cozinha como espaço do sagrado no culto de Òrìṣá: notas introdutórias. Revista JRG de Estudos Acadêmicos , Brasil, São Paulo, v. 8, n. 19, p. e082358, 2025. DOI: 10.55892/jrg.v8i19.2358. Disponível em: https://revistajrg.com/index.php/jrg/article/view/2358. Acesso em: 10 ago. 2025.

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